domingo, 26 de setembro de 2010

Eu só sei chorar

Eu não consigo não chorar.
Eu não sei não chorar.
Quando as lágrimas umedecem os olhos,
finalmente percebo que já estou chorando.
E pior é chorar pra qualquer um.
Vejo alguém que passa e choro.
Vejo uma flor que cai e choro.
Volto de uma noite em claro e choro.
Ao invés disso, eu queria rir.
Pra qualquer um.
Mas eu só sei chorar.

Laura Santos trancos e barrancos way of life.

sexta-feira, 24 de setembro de 2010

O mais fundo do alívio

Depois de meses ele apareceu na minha janela.
Não para conversar, nem para saber como eu estava.
Ele não perguntou nada.
Ficou parado sorrindo como se
sorrisse pela primeira vez depois de anos.
Eu não entendi o que ele quis dizer porque
mesmo durante dias juntos eu nunca consegui
decifra-lo, nem descobri-lo.
Cheguei, até, pensar que duraria.
E dividi minha vida em águas. As
que eu fui e as que eu seria por ele.
Mas eu não mereci. E como folhas
de outono ele se foi. Só que mais rápido.
A dor bateu como o golpe mais certeiro
e profundo de um chacal e o que me
consolou foram lágrimas que eu chorei
todas as noites antes de dormir, todas as
madrugadas em claro, todos
os sóis que nasciam um dia depois do outro
sem piedade e sem atraso.
Eu desejei a morte a não tê-lo
e nunca me perdoei por ele ter me
deixado.
Meu mundo desabava em cacos a cada vez
que seus olhos brilhavam no escuro,
longe do meu alcance.
E por dentro, um pedaço do coração caia
desconsolado.
Mas um dia eu acordei conformada
e entendera que ele nunca me pertenceria
porque ele escolheu partir.
Não eu que fiz alguma coisa de errado.
Eu era uma uma ave que voava rumo infinito
mais alto.
Agora, enquanto escrevo essas palavras,
ele continua sorrindo, só que pro nada
porque eu resolvi dar as costas bem ali
pra aquele resto de passado, agora e finalmente
bem resolvido

Laura Santos

Poema para uma noite

A noite tinha gosto de vinho.
Meus sentidos ficaram aguçados
pelo álcool que percorria minhas veias
até a cabeça girar tonta.
Não poderia me esquecer da meia luz
que vinha da lua cheia do lado
de fora da janela entre-aberta.
Era uma noite quente e febril
de outubro.
Não sei se fazia de trilha
a música que tocava
ou as confissões que
trocavamos entre palavras,
gestos e gemidos cerrados.
Tinha a estranha sensação
de querer ficar para sempre,
não apenas enquanto as
horas se arrastavam madrugada
adentro naquele quarto que já
vira tantas chegarem e partirem.
A pele produzia suor salgado.
A boca, beijos molhados.
Os olhos, palavras que não
foram ditas.
O corpo, gestos que não
poderia descrever.
Deitei-me úmida, de cabelos molhados
e embaraçada por consequencias
da bebida e do barato.
No chão, vi seu corpo
cansado estendido
adormecido belamente
cercado por nossas roupas
e segredos espalhados
com tanta desorganização
que denunciavam a pressa
do nosso desejo humano.
Logo eu também caíra no sono
e dormira sentido o céu no chão
e o gosto do pecado na boca.
E depois de tempos passados
ainda não sei se fiz dessas lembranças
sonho do sono que eu dormia
ou apenas desejo de que elas
retornassem mesmo depois
que um último beijo, um adeus
meio frio, fora a despedida
de corpos que nunca mais
se reencontrariam para uma
quinta vez.

Laura Santos

quarta-feira, 22 de setembro de 2010

Eu sou publicitária, graças a quem merecer

Eu sei que o prazo era pra ontem, mas não deu. Não posso simplesmente conceber uma ideia como quem concebe um filho. E mais difícil, tornar a ideia viável e funcional. Eu pago por isso. Não em dinheiro, mas em estresse. Costumo me irritar ter que produzir em questão de horas quando isso leva dias. Não gosto de ter que comprometer a qualidade das coisas que crio. É um erro de português, um título mal posicionado, um texto mal explicado. São séries de minúsculos erros que somam o total da nenhuma perfeição. Eu escuto por isso. O telefone toca, o atendimento fala, eu calo. Eu leio por isso. O email urgente, o lembrete em cima da mesa, o post-it colado no monitor. Eu me culpo por tudo isso junto. A falta de atenção, a falta de criatividade, a mau execução. E eu rio. Do prestigio merecido, do erro de português grifado, de não ter ido vender coco na praia e de ter ficado até mais tarde esperando a prova chegar.

Laura Santos

Beijos do mar

Assim como os dias, também quero vidas.
Uma atrás da outra.
Só pra ganhar beijos amados
do mar que é meu e de mais
ninguém.

Laura Santos

segunda-feira, 20 de setembro de 2010

A vida é sonho [Calderón de La Barca]



"Ai de mim, ai, pobre de mim!
Aqui estou, ó Deus, para entender que crime cometi contra Vós.
Mas, se nasci, eu já entendo o crime que cometi.
Aí está motivo suficiente para Vossa justiça, Vosso rigor, porque o crime maior do homem é ter nascido.
Para apurar meus cuidados, só queria saber que outros crimes cometi contra Vós além do crime de nascer. Não nasceram outros também?
Pois, se os outros nasceram, que privilégios tiveram que eu jamais gozei?
Nasce uma ave e, embelezada por seus ricos enfeites, não passa de flor de plumas, ramalhete alado quando veloz cortando salões aéreos, recusa piedade ao ninho que abandona em paz.
E eu, tendo mais instinto, tenho menos liberdade?
Nasce uma fera e, com a pele respingada de belas manchas, que lembram estrelas.
Logo, atrevida e feroz, a necessidade humana lhe ensina a crueldade, monstro de seu labirinto.
E eu, tendo mais alma, tenho menos liberdade?
Nasce um peixe, aborto de ovas e Iodo e, feito um barco de escamas sobre as ondas, ele gira, gira por toda parte, exibindo a imensa habilidade que lhe dá um coração frio.
E eu, tendo mais escolha, tenho menos liberdade?
Nasce um riacho, serpente prateada, que dentre flores surge de repente e de repente, entre flores se esconde onde músico celebra a piedade das flores que lhe dão um campo aberto à sua fuga.
E eu, tendo mais vida, tenho menos liberdade?
Assim, assim chegando a esta paixão, um vulcão qual o Etna quisera arrancar do peito, pedaços do coração.
Que lei, justiça ou razão pôde recusar aos homens privilégio tão suave, exceção tão única que Deus deu a um cristal, a um peixe, a uma fera e a uma ave?"

Só posso dizer que chorei litros. E como não?

sexta-feira, 17 de setembro de 2010

outros erros

gastar quanto tenho no bolso,
dormir oito horas por dia,
não falar palavrão,
comer coisas saudáveis,
não chorar em público,
não beber até cair,
não fumar,
escrever deus com letra maiúscula.
quero cometer novos erros,
porque os velhos já estão ficando
meio monótonos.

laura santos rest in peace

sexta-feira, 10 de setembro de 2010

pela ultima vez

pela última vez eu quero que seja
a última vez que escrevo as misérias
que esse descaso de amor me deixou
porque pela primeira vez você escolheu
estar com a minha ausência,
quando pela última você me teve perto.
pela última das primeiras vezes
eu vou, mais que aceitar, entender
que desmereci o que de bom há em você
e por vez nenhuma não quero que
me reste apenas a maldade da saudade,
aquela que aperta no peito e que mareja
os olhos que um dia te admiraram de perto.
e pela última vez vou olhar fotos antigas
e pela última vez vou fingir um sorriso.
porque pela primeira vez eu quis te amar,
mas pela última vou chorar, lamentar,
escrever e sofrer por esse amor que nunca existiu.

Laura Santos pela última vez.

Compilação

Eu não saberia contar
quantos personagens tenho,
quantas emoções senti,
quantas sensações vivi.
Por isso, marquei, a tinta e dor,
a dor das tintas que por tantas
vezes a vida me coloriu.
Ou apagou.



" A vida é a arte do encontro, embora haja tanto desencontro pela vida"

quarta-feira, 8 de setembro de 2010

A vida depois de você

Todos os dias eu tenho um motivo pra acordar e sorrir, tomar café da manhã e ir trabalhar. Todos os dias eu tenho um motivo pra exercitar minha criatividade, sorrir com meus amigos, fazer minhas refeições na hora certa. Todos os dias eu tenho um motivo para prosseguir, pra não me deixar levar, pra não desanimar, esmorecer. E mais do que o motivo em si, eu tenho o acreditar. Acredita nele e em tudo aquilo que ele pode me dar. E mais do que um motivo todos os dias, para todos os motivos eu tenho um milhão de dias. E o motivo é que existia vida antes de você. E depois de você ela ainda continua, mesmo sem você. Ainda existe vida. O maior motivo pra todos os meus dias.

Laura Santos ao som de Life after you

quarta-feira, 1 de setembro de 2010

nem pra não prestar

nada poético, literalmente correto, nada de rimas, de sacadas literárias, nada de nada. nada só pra dizer a verdade. que meu estômago arde e que eu ainda quero chorar. que não me sinto confortável com o passado e que o presente voltou a me incomodar. que nunca fui mais eu e que continuo sendo mais ele(s). que a abandono dói, que a ausência dói, que a falta dói, que tudo, absolutamente tudo dói. que até uma música alegre me dói. não tô bem. não quero falar. não quero saber. não quero que ninguém saiba. foda-se o tempo, foda-se tudo em que eu acredito. não cheguei mais longe que esperava. sou uma mal-amada SIM. não gosto de novidade, não tô nem aí pra ninguém e não vou me importa se isso machuca. não sou feliz, não tenho metade do que eu queria ter e não visitei tudo que eu queria. não sou jovem, eu tô ficando velha, o mundo me provoca náuseas. eu sou profundamente melancólica, não gosto de domingo e não gosto que me acordem. eu esqueço quem não me interessa e me esqueci também, porque eu sou demasiadamente desinteressante. encarei os fatos. eu não sirvo pra nada. pra amar e ser amada. pra pagar conta e manter a casa limpa. pra tomar remédios na hora certa e fazer um tratamento decente. pra tentar ser melhor e me fazer bem. eu não sirvo nem pra não servir pra nada. isso explica grande parte da minha razão inútil e totalmente desprezível.

Laura Santos. quem?